Tuesday, January 25, 2011

Campus Party se consolida como o evento que pode garantir o futuro de jovens empreendedores

Publicada em 24/01/2011 às 12h34m
Rennan Setti e Wagner Gomes

SÃO PAULO - Eles não vestem ternos, vivem em barracas e passam parte do dia encarnando personagens de games, mas não param de ser assediados por empresas e fundos de investimento com cofres cheios de dinheiro para bancar suas ideias. Inspirados em novos magnatas como Larry Page, da Google, e Mark Zuckerberg, do Facebook, os nerds da Campus Party agora apostam numa espécie de "nerdismo aplicado", cujo dicionário inclui termos como start-ups (novas empresas, especialmente de tecnologia), venture capital (dinheiro investido em novas companhias) e empreendedorismo.

O evento encerrado sábado, que reuniu em São Paulo 6.800 fãs de tecnologia, teve dez painéis exclusivamente de negócios. Empreender foi a missão dada até por veteranos da internet, como Steve Crocker e John "Maddog" Hall (presidente da Linux), remanescentes de uma época em que dinheiro estava (quase) em último plano entre os nerds.

Executivos de fundos de venture capital falam que a Campus é uma oportunidade de conhecer ideias de futuros negócios, mas só 1% delas receberá investimento. O fundo de capital de risco Confrapar, por exemplo, encontrou na feira só uma oportunidade concreta. Emerson Duran, diretor do fundo Avanti da Confrapar, com caixa de R$ 120 milhões, diz que está sendo discutida com uma start-up a possibilidade de um investimento de até R$ 1,5 milhão.

É importante investir em formação
Segundo o diretor-executivo da Confrapar, Carlos Guillaume, o retorno esperado do investimento em um portfólio de 12 start-ups é de 30% a 40% no ano. Para uma empresa realmente bem-sucedida, o retorno projetado é de 100%. Em 2011, a Confrapar deve investir em até dez start-ups, com aporte médio de R$ 600 mil a R$ 1 milhão.

- Além de critérios objetivos, outro ponto importante é a pessoa. A gente quer ver motivação, sangue nos olhos, capacidade de aprender mais. Não adianta ter um bom plano de negócios e não ter uma postura assertiva - afirmou Daniel Izzo, cofundador do fundo Vox Capital. - Hoje há dinheiro no Brasil e no mundo todo para investir. Bons projetos, há alguns. O grande gargalo é gente com capacidade para tocar o negócio. A educação é deficiente. Os jovens empreendedores precisam investir em formação.

Executivos de fundos de venture capital esperam uma explosão de aportes milionários em 2011. Mas a euforia pode causar problemas.

- Acho que estamos prestes a entrar numa bolha de investimentos em start-ups. Vai ter um monte de índio investindo onde não deve - afirmou Yuri Gitahy, fundador da Aceleradora.

Para o empresário Aleksandar Mandic, a Campus não é uma feira de negócios, mas favorece a interação entre empreendedores.

- Empreendedorismo sempre foi a chave para o futuro, mas quando comecei não tínhamos consciência disso. Hoje em dia, a garotada tem - afirmou, apontando ainda a carência de engenheiros como o grande entrave ao desenvolvimento do mercado de tecnologia no Brasil.

A Campus Party também incentivou o empreendedorismo realizando dois concursos para inventores e jovens empresários. O engenheiro Daniel Bronzeri, de 34 anos, foi um dos finalistas com um aplicativo de tecnologia de assistência. O Que-Fala!, que roda em tablets com Android e iOS, para ajudar pessoas com dificuldades de comunicação. Com uma biblioteca visual, o deficiente pode clicar no ícone que deseja pronunciar, e a máquina fala por ele. Bronzeri precisa entre R$ 200 mil e R$ 300 mil para fechar o projeto. A dificuldade, explicou, é que no Brasil não há patrocínio a projetos de tecnologia de assistência.

- O grande incentivo é a fortuna do Mark Zuckerberg ou dos criadores do YouTube. Antes, os nerds não se viam como homens de negócios - disse Gabriel Colasso, que comanda os concursos na Campus Party.

Em busca de mão de obra qualificada
Além de investimentos milionários, a reunião de milhares de geeks representa uma chance de recrutamento para grandes companhias e institutos de pesquisa. O engenheiro da Nasa Mike Comberiate e o consultor Marco Figueiredo, por exemplo, foram à Campus Party com a missão de levar dez brasileiros para um estágio na agência espacial americana.

Até agora, só quatro brasileiros estagiaram na Nasa, em julho passado. Dois conseguiram um estágio na Agência Espacial Brasileira ao voltar. Segundo Figueiredo, apesar de não ter um programa específico para estagiários estrangeiros, a Nasa admite estudantes de todo o mundo. Pelo menos 40 estudantes já procuraram Comberiate e Figueiredo. A seleção será feita por meio de um desafio:

- Eles terão de participar da construção de um software de imagem 3D de um radar. Os mais bem-sucedidos ficam com a vaga - disse Figueiredo.

Para Ben Hammersley, editor especial da "Wired UK", a Campus Party pode ser a chance de as empresas driblarem um problema global:

- Pessoas inovadoras não querem mais trabalhar em empresas tradicionais. A filosofia de entrar em uma empresa aos 22 anos e sair aos 60 não vale mais. Hoje, os melhores profissionais não querem um trabalho, querem um problema estimulante para resolver - afirmou. - Todos os empregos que tive não existiam até pouco tempo. Agora, por exemplo, esperamos pelo iPad 2, mas há um ano não havia sequer o iPad. Por conta dessa dinâmica de mudanças permanentes, as pessoas inteligentes não pensam mais em seu trabalho a longo prazo. Querem resolver o agora.

Na busca por novos talentos na feira estavam Telefônica e Vivo, patrocinadoras do evento. Elas enviaram 16 profissionais de recursos humanos para recolher currículos. Segundo Fábio Tadashi, gerente de Transformação Organizacional da Vivo, o contexto brasileiro de quase pleno emprego faz com que grandes empresas não necessariamente atraiam talentos.

A empresa de software Totvs também aposta em recrutar na feira, na qual buscou engenheiros de pesquisa e desenvolvimento e programadores de Java Pleno. Françoise Trapenard, diretora-executiva de RH da Telefônica, é bem otimista:

- Essa juventude será a responsável pela nova onda da internet. Na Campus Party pode estar o idealizador dos novos Google ou Facebook.

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